Se a Rua Beale Falasse, de James Baldwin

terça-feira, agosto 06, 2019



Título original: If Beale Street Could Talk
Editora: Companhia das Letras
Tradução: Jorio Dauster
Páginas: 223
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Tish está esperando um filho enquanto luta para livrar seu marido de uma acusação criminal injusta e de subtextos racistas, a tempo de tê-lo em casa para o nascimento de seu bebê.

Com certeza James Baldwin já é a minha descoberta do ano. Infelizmente, não conhecia o autor antes e depois do lançamento do filme “Se a Rua Beale falasse” (premiado, aclamado pela crítica e que levou a atriz Regina King a ser premiada no Oscar por seu papel coadjuvante), finalmente ele chegou ao meu radar e isso não poderia ter sido melhor. O meu primeiro contato com a escrita do autor foi com “O Quarto de Giovanni” e logo depois que terminei de ler, comprei o livro que deu origem ao filme que felizmente colocou este autor em evidência. 

‘Se a Rua Beale Falasse’ é a memória de Tish, contada em retrospecto. Ela acaba de descobrir que está grávida e está prestes a contar isso ao seu noivo, Fonny, receosa sobre a sua reação, já que ele havia sido injustamente preso há três meses e, por isso, o destino deles já era incerto antes, mas com o bebê, se torna ainda mais imprevisível. Depois de contar a novidade ao marido, Tish começa a revelar gradativamente a vinda da criança para os demais personagens da trama, começando pela sua mãe, depois passamos para a sua família e a família de seu noivo. 

“Espero que ninguém nunca seja obrigado a ver a pessoa que ama através de um vidro.” 

Cada momento é trançado com lembranças da personagem, levando o leitor a questionar as injustiças passadas na década de 70 nos Estados Unidos por pessoas negras que, tristemente, ainda refletem os dias de hoje com uma proximidade assustadora. Estas memórias nos apresentam detalhes mais profundos dos personagens, principalmente do casal principal, chegando a abordar momentos da infância e da evolução da relação dos dois, mas Baldwin não se limita a eles e traz também o retrospecto de outros personagens que acrescentam à história mais casos de racismo e injustiça social. 

“Ele não era o preto de ninguém. E isso é um crime na porra desse país livre. Supõe-se que você seja o preto de alguém. E se você não for o preto de alguém, então você é um preto mau.” 

Para mim, o ponto mais alto dos livros de James Baldwin é a narrativa. Baldwin, falecido em 1987, sabia como dosar perfeitamente seus textos, trazendo intensidade nos momentos certos e pincelando sutilmente os temas que, apesar de importantes, não influenciariam tanto no rumo da história. É muito fácil visualizar as cenas descritas e sentir o que ele passa pelos seus personagens, como na cena (ainda no início do livro) em que Tish revela que está esperando um bebê; a reação de cada personagem é única e eu me vi feliz, aliviado, triste e revoltado. Tudo ao mesmo tempo. 

“Fico com medo cada hora que está longe de mim. E talvez o que aconteceu agora tenha sido culpa minha porque eu não devia nunca ter te deixado sozinha [...]” 

A história de ‘Se a Rua Beale falasse’, apesar de triste e revoltante em grande parte da narrativa, traz certa esperança. Eu, homem branco, ao ler as situações desgraçadas que ninguém deveria passar pela cor da sua pele ou por qualquer diferença social ou sexual narradas no livro, me senti incapaz. Mais triste ainda é perceber que em 1970 os personagens passaram por histórias que ainda hoje são comuns e vividas por pessoas próximas a mim. Mesmo assim, esse tipo de história deve chegar a cada vez mais pessoas, é um processo que já deveria ter acontecido há tempos, para que cada vez mais gente sinta empatia e para que, a cada vez, as histórias negras carreguem mais e mais esperança e finais felizes.

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